sábado, 29 de março de 2008

29 DE MARÇO - POTY, O PAINEL VIVO DA ARTE UNIVERSAL

Poty Lazzarotto me deu uma das últimas entrevistas, ou quem sabe a última. Não sei… Um outro amigo sabia disso e me pediu que fizesse um texto, no dia da morte do artista, para constar de um livro, baseado na tal última entrevista que eu havia feito com ele. Isso foi há mais de 10 anos. O texto é o que segue:

Napoleon Potyguara Lazzarotto, ou simplesmente Poty. Morreu o homem, mas permaneceu o mito de um artista universal, que se confunde com a própria cidade em que nasceu. Poty e Curitiba comemoravam aniversário no mesmo dia 29 de março há mais de meio século, desde 1924. Brincalhão, pregou uma peça à cidade: Ao morrer, no dia 8 de maio (de 1998), frustrou o brilho da festa do próximo ano. Poty jamais dizia a idade que tinha. Mas a indeterminação do tempo era um direito adquirido ao longo dos anos, pelo universo de suas obras espraiadas por toda Curitiba, identificando ambos no mesmo espaço e em um único abraço.

Poty e Curitiba são, hoje, “griffes” internacionais. O artista influenciou toda uma nova geração de profissionais: poetas, escritores, jornalistas, artistas, urbanistas e até arquitetos. Com Poty, formou-se um novo traço que identifica, une e transcende espaços e tempo. Criou-se uma nova cultura regional que ultrapassou fronteiras, imaginações e desafios. Mas, modesto e simples como os grandes gênios, Poty tentava explicar: “Em matéria de amigos, circunstâncias e fatos, sempre tive muita sorte. Nasci empelicado. Nada de extraordinário, todas as oportunidades apareceram no momento exato”.

Como se fosse comum uma criança ler aos quatro anos de idade, como ele o fez, na tentativa de saciar a própria curiosidade pelas estranhas e atraentes figuras dos livros, da história universal, que transbordavam uma banheira antiga que existia na casa de seus pais. “Essa banheira é a minha mais remota memória de infância”, dizia maroto. Uma imagem que ficou registrada em seus primeiros desenhos que reproduzem cenas históricas de assírios, egípcios e romanos. Cenas que nada tinham a ver com o bairro em que nasceu. “Nasci no suposto Cajuru, depois minha família se mudou para o suposto Capanema. O bairro continua no mesmo lugar. Mas hoje leva o pomposo nome de Jardim Botânico”, brincava.

Nada do bairro lembra o tempo em que os meninos, como Poty, levavam as vacas leiteiras para o campo dos Kemps. Poty se deixava levar pelas lembranças e sorria, deixando escapar o menino que ainda guardava em algum cantinho dele. E o menino se tornava real nas lembranças do artista. “Esse era um tempo bom e feliz”, testemunhava. Era um tempo em que a zona urbana de Curitiba terminava na rua João Negrão.

“O resto era um só banhado”, atestava satisfeito. Menino, já era fascinado pela vida. Observava o cotidiano e se deslumbrava com as luzes e as sombras, o preto e o branco. E registrava tudo o que via: histórias, guarda-freios, visitadores de locomotivas, tudo... “Imagine a perspectiva de uma criança de oito anos que vê, pela primeira vez, um bonde. Ah! Eu acho que as crianças de hoje nem percebem seus traços. As cidades são mutantes...”, resumia.

Mas nem as rápidas transformações urbanas lhe tiraram a sensibilidade. “Sempre tive a noção exata da miséria do povo”, refletia comovido. Fragmentos de vida eram contados, em reminiscências, como as sucessivas enchentes que aconteciam na cidade. “A gente acordava no meio da noite com a água invadindo a casa. O refúgio era o sótão”, contava, deslumbrando o ouvinte. “Hoje, o inimigo é outro e variado”, acrescentava em uma análise lúcida sobre o seu próprio tempo. A rua - a que se referia - era a Avenida Capanema, atual Affonso Camargo. “Quando as águas baixavam era uma lama só e uma trabalheira danada”, recordava.

As marcas de uma dessas enchentes ele carregou para sempre: um ferimento grave em um dos olhos. O menino Poty entrou em uma tina de lavar roupa e foi navegando, aventureiro, naquele novo rio. Na volta, a tina afundou e ele ficou preso em uma taquara que lhe atingiu um olho. Mas nem a fatalidade lhe roubou a vontade de viver. O sofrimento e o tampão no olho não o impediram de assistir, junto com as primas, a todos os filmes que quis.

Adorava cinema. Não entendia nada do enredo, mas confessava que ficava fascinado. Os filmes eram em preto e branco e era o que importava. “O colorido nunca me impressionou”, ressaltava. Não que ele não apreciasse os pintores das cores. “É que a minha natureza me leva para o preto e o branco”, explicava. Para ganhar uns trocados, foi distribuir o jornal Diário da Tarde. Logo depois, já publicava os seus primeiros desenhos no mesmo jornal. Assim, em quadrinhos, surgiu Haroldo, o Homem Relâmpago. Poty tinha apenas 14 anos.

Nesta época, o acesso aos livros de pintura, principalmente europeus, era muito difícil. Mesmo assim, conheceu Goya e Rembrandt. A cor da pintura era verde. “Era tudo verde”, relembrava rindo. Logo depois viajou, estudou e chegou mais perto “desse mundo encantado e mágico”, que ele soube captar em traços, com beleza e talento raros.

Em 1954 Poty se casou com uma mineira, Célia Neves. “Ela não possuía uma beleza clássica. Mas bastavam dois minutos de conversa e ela se tornava belíssima”, dizia orgulhoso e feliz. Com a morte da mulher, veio a solidão que ele desdenhava com um balançar de ombros.

Poty ensinava que a ausência é apenas física. E para quem duvida, basta passear pela cidade para ver Poty em cada canto, parede e monumento. Curitiba e Poty se abraçam, se confundem, e se fundem em uma única obra de arte e de humanidade. Para sempre.

Vania Mara Welte

quarta-feira, 26 de março de 2008

O AMOR EXISTE. ACREDITE

Olha só a declaração de amor que Isidoro Prado fez à sua amada, a bela Leila Amarante:

Árdua missão a de inaugurar o testemunho sobre Leila Amarente. Difícil é querer defini-la, AMIGA. Quantos anos de cumplicidade... Você foi sempre quem me deu um pedacinho do chão, quando era de terra firme que eu precisava, ou um pedacinho do céu, quando o sonho me fazia falta.

Mais que ombro amigo sempre foi mão estendida, mente aberta, coração pulsante, costas largas. Aprendi muito, por você nunca ter tido o egoísmo de não querer compartilhar o que aprendeu. É a compreensão para o meu cansaço e a insatisfação para a minha reticência. É aquela que entende meu desejo de voar, de sumir devagar, a angústia pela compreensão dos acontecimentos, a sede pelo "por vir".

É, ao mesmo tempo, espelho que me reflete, é óleo derramado sobre minhas águas agitadas. Se enfurece ao enxergar meu erro, por me querer tanto bem e saber que a perfeição é utopia. É o sol que seca minhas lágrimas, é a polpa que adocica ainda mais meu sorriso.Tem medo, dor, náusea, cólica, gozo, igualzinho a mim. Sabe que viver é ter história pra contar.

Sorri pra mim sem motivo aparente, sofre com meu sofrimento, é a “boadrasta” filosófica dos meus filhos. Acha em mim aquilo que nem mesmo eu sabia que buscava. Ensinou-me tudo que sei sobre informática, me manda pequenos bilhetes pelo MSN, mensagens eletrônicas ternas e emocionadas. Me ouve ao telefone mesmo quando a ligação é caótica, com o mesmo prazer e atenção que teria se estivesse olhando em meus olhos.

Ela é multimídia. Olhos... fala e ouve com o olhar, o meu e o dela em sintonia telepática. Percebe em meus olhos meus desejos, meus disfarces, alegria, medo. Aguarda pacientemente e se entusiasma quando vê surgir mesmo que uma pequena fagulha daquele tão esperado brilho em meu olhar, e é quem tem uma palavra sob medida quando estes mesmos olhos estão amplificando tristeza interior.

Leila é lua nova, é a estrela mais brilhante, é luz que se renova a cada instante, com múltiplas e inesperadas cores que cabem todas na sua íris. É aquela que me diz "eu te amo", sem qualquer medo.

Nós nos amamos "e ponto". Leila é verdade e razão, sonho e sentimento, meu porto seguro. Somos pra sempre, mesmo que o sempre não exista.

Isidodo Prado

(Não sei de quem é o texto. Eu o encontrei, uma vez, no site
www.obrilhodaestrela.blogger.com.br, ao descrever o amor entre pessoas amigas. No entanto, conheço Leila e Isidoro e penso que o texto foi feito sob medida para os dois.)

(NOTA: Recebi um comentário de Marcelo Batalha, onde ele afirma ser o autor do texto acima. Ele dá até o título. "Amigo, Um Ensaio". Por favor, veja nos comentários, o texto original de Marcelo Batalha e a minha resposta. Grata ao Marcelo Batalha, a você - que lê o que eu publico aqui -, e, ainda, à Leila e ao Isidoro, um casal que prova que o amor existe. E para sempre. Acredite. VMW)

sábado, 22 de março de 2008

CECÍLIO ASSOMBRANDO SÃO PEDRO

No final da manhã de ontem houve confusão no céu. São Pedro foi receber Cecílio do Rego Almeida, abriu o site do Google e viu lá que havia 77.600 citações do seu novo hóspede.

Número pequeno para quem teve a vida de Cecílio. Deve ter dado muito mais informações a São Pedro sobre os amores e ódios que despertou enquanto esteve por aqui. Principalmente obre a tal da timidez paranaense que tem um medo danado de quem ousa. Isso dá inveja, foge dos padrões, é duro ter sucesso nessa terra sombreada pelo que sobrou dos pinheirais.

O jornal “O Estado de São Paulo” de sábado, em seu editorial, lembra que foram feitos 490 mil grampos no país no ano passado. Em agosto do 1971, Cecílio grampeou o governador indicado pelo presidente Médici em Copacabana, e tornou êfemera a estada de Haroldo Leon Peres no Palácio Iguaçu. Leon Peres queria uma comissão fora dos padrões dos empreiteiros da época sobre a construção da ferrovia Central do Paraná (Apucarana-P.Grossa), e dançou.

Naqueles tempos grampo detonava até governador, hoje em dia….bem hoje dia… dá serviço comunitário e consultoria de empresas, além do uso e fruto do nosso dinheiro. Cecílio não era fácil. A CR Almeida era “estradeira”, tradução: construtora de rodovias. Queria sua empresa “barrageira”. Sua meta era estar no “surubão”, consórcio das maiores empreiteiras que construíram Itaipu. Se associou à italiana Impregillo que por sua vez tinha interesses na Fiat, para se associar e construir a hidrelétrica de São Simão, na divisa de Minas com Goiás.

Pegou uma briga homérica com a maior empreiteira mineira - a Mendes Junior, e de metralhadora em punho enfrentou a adversária num hotel de Belo Horizonte, e fez São Simão. A Fiat foi pra Minas, mas a CR Almeida não entrou em Itaipu. Não era confiável ao “surubão”, onde estavam a Odebrecht, Andrade Gutierrez, OAS e outras. Cecílio tinha na sua ficha a queda de Leon Peres.

Numa sexta à noite, no início da década de 80, eu estava na Veja , e durante horas, madrugada adentro, ele foi trocando as lentes do seu minúsculo óculos e contando suas aventuras empresariais numa longa entrevista. Era um peitudo, um raçudo. Não respeitava limites, todos que se atravessavam tinham um preço. Fez e desfez feito uma motoniveladora.

A revista não publicou nada e eu perdi essa gravação memorável de um homem que não brincava em serviço, nem fora dele. Será uma perda enorme se ele não deixou registrada suas memórias. Tem gente graúda que torce por isso. São Pedro deve estar assombrado com o que está ouvindo.

(Texto do jornalista Hélio Teixeira publicado no Site Jornale, no Blog do Zé Beto, neste sábado, 22.03.2008)

quinta-feira, 20 de março de 2008

REFLEXÕES SOBRE O CASO DE GUARATUBA

“ A Justiça sem a força é impotente;
A força sem a Justiça é tirânica.
A Justiça sem a força será contestada,
porque sempre haverá maus.
E a força sem a Justiça será acusada.
É preciso, pois, reunir a Justiça e a força;
e, dessa forma, fazer com que o justo seja forte
e que o forte seja justo.”

(Pascal)

STF ACATA LIMINAR E SUSPENDE NOVO JÚRI DAS ABAGGE

Este foi o título estampado, na última semana, pela maioria dos Jornais, Revistas e Sites de Notícias. A maioria dos jornalistas que fez matérias com títulos semelhantes, acompanhou o mais longo Júri da história da Justiça do país – 34 dias, noites e madrugadas -, leu e investigou o caso, que ficou conhecido na imprensa mundial como “As Bruxas de Guaratuba”, e, profissionais corretos e dignos, eles assinaram os seus textos.

E, nenhum desses profissionais da imprensa usou termos pejorativos ou, ainda, colocou, como os anônimos de algumas revistas “ditas especializadas”, frases assim: “Celina e Beatriz Abagge são acusadas de encomendar o assassinato de uma criança em Guaratuba (Paraná) para um ritual de magia negra”. Ora, não há nem provas de que o corpinho encontrado seja o de Evandro Caetano. Os exames odontológicos estavam rasurados e com erros de identificação dentária, entre outras coisas. E os dois primeiros exames de DNA foram “inconclusivos” e o terceiro foi questionado judicialmente.

Poucos sabem que, em 1992, Celina e Beatriz Abagge (mãe e filha do então prefeito Aldo Abagge, de Guaratuba, e já falecido) e mais cinco homens – Osvaldo Marcineiro, Davi dos Santos, Vicente de Paula, Sérgio Cristofolini e Airton Bardelli - foram seqüestrados e torturados por autoridades, da área de segurança pública, para confessar um crime contra um garotinho, Evandro Caetano (que estava desaparecido assim como outros mais de 20 menores de idade, no Paraná). Um crime que todos os sete juram jamais terem cometido. Mesmo assim, as duas mulheres e os cinco homens ficaram presos, sem julgamento, por quase sete anos.

Celina Cordeiro Abagge e Beatriz Cordeiro Abagge, mãe e filha, já foram absolvidas em um Júri popular, assim como Bardelli e Cristofolini, uma vez que não há uma só prova contra os ex-acusados. (Exceto a própria confissão sob tortura). Mesmo assim, o Ministério Público recorreu para anular o Júri das Abagge. Os seus advogados de defesa entraram com recursos e ganharam uma liminar no Supremo Tribunal Federal (STF), para suspender a realização de um segundo julgamento pelo Tribunal do Júri, em Curitiba, que estava marcado para o dia 24 de março deste ano.

Ao analisar o pedido, o ministro Eros Grau frisou que o pedido versa sobre a produção de prova pericial, que teria desrespeitado o princípio do contraditório. O relator deferiu o pedido de liminar para suspender o julgamento já agendado até que o Supremo analise o mérito da ação.

Este, a análise do mérito da ação, é um ato de enorme dificuldade para qualquer leitor. Imagine-se para quem deve julgar um processo de mais de 10 mil páginas, eivado de erros e provas adulteradas, rasuradas, contradições, depoimentos falsos que, no decorrer do Júri em São José dos Pinhais, resultaram na prisão de alguns dos depoentes e, ainda, no suicídio de um perito às vésperas dele depor contra as Abagge. Um pobre homem atormentado e pressionado que preferiu a morte.

No Paraná há dezenas de crianças desaparecidas e que, ainda desaparecem como em todo o mundo. Basta lembrar o recente caso da pequena inglesinha, Madeleine, que desapareceu em Portugal. Mas lá, os jornais vão ter de pagar uma pesada indenização aos pais da menina desaparecida. Já, no Brasil, o disque-disque e as maledicências correm soltas. Mas, afinal, o que se pode esperar de uma cidade que ergueu, na sua principal avenida, um monumento à Boca Maldita?!

É para refletir, porque com más palavras, quantas famílias, quantas vidas são dilaceradas e, até perdidas, vítimas fatais, quando o essencial era criar instrumentos eficazes de proteção e de busca às crianças desaparecidas! Como, por exemplo, um “Alerta Amber”, semelhante ao dos Estados Unidos e que recupera essas pequenas vítimas em poucas horas. Mas, no Brasil, infelizmente, é mais importante recuperar os nossos carros roubados. Não é mesmo?!

Estas são histórias verídicas e, uma delas, poderia ser a sua. Pense nisso!

Vania Mara Welte

domingo, 9 de março de 2008

REFLEXÕES

..."Pegue para você o que lhe pertence,
e o que lhe pertence é tudo
o que sua vida exige.
Parece uma vida amoral.
Mas o que é
verdadeiramente imoral
é ter desistido de si mesma."


...”Sou como você me vê
Posso ser leve como uma brisa,
ou forte como uma ventania,
depende de quando,
e como você me vê passar" !

Poemas de Clarice Lispector

domingo, 2 de março de 2008

SONETO DE FIDELIDADE

De tudo ao meu amor serei atento
Antes, e com tal zelo, e sempre, e tanto
Que mesmo em face do maior encanto
Dele se encante mais meu pensamento.

Quero vivê-lo em cada vão momento
E em seu louvor hei de espalhar meu canto
E rir meu riso e derramar meu pranto
Ao seu pesar ou seu contentamento

E assim, quando mais tarde me procure
Quem sabe a morte, angústia de quem vive
Quem sabe a solidão, fim de quem ama

Eu possa me dizer do amor (que tive):
Que não seja imortal, posto que é chama
Mas que seja infinito enquanto dure.

Vinicius de Moraes, "Antologia Poética", Editora do Autor, Rio de Janeiro, 1960, pág. 96.