domingo, 23 de dezembro de 2007

DE AMOR

Que a força do medo que tenho,
não me impeça de ver o que anseio.
Que a morte de tudo o que acredito,
não me tape os ouvidos e a boca,
pois metade de mim é o que eu grito,
mas a outra metade é silêncio.

Que a música que ouço ao longe

seja linda ainda que tristeza.
Que a pessoa que eu amo,
seja pra sempre amada, mesmo que distante,
porque metade de mim é partida
e a outra metade é saudade.

Que as palavras que falo
não sejam ouvidas como prece,
nem repetidas com fervor:
apenas respeitadas como a única coisa que resta a mim,
inundada de sentimento,
porque metade de mim é o que ouço,
mas a outra metade é o que calo.

Que essa minha vontade de ir embora
se transforme na calma e na paz que eu mereço.
Que essa tensão, que me corrói por dentro,
seja um dia recompensada,
porque metade de mim é o que penso
e a outra metade um vulcão.

Que o medo da solidão se afaste.
Que o convívio comigo mesmo se torne,
ao menos, suportável.
Que o espelho reflita em meu rosto um doce sorriso,

que me lembro ter dado na infância,
porque metade de mim é a lembrança do que fui
e a outra metade não sei.

Que não seja preciso mais que uma simples alegria,

pra me fazer aquietar o espírito
e que o teu silêncio me fale cada vez mais,

porque metade de mim é abrigo,
mas a outra metade é cansaço.

Que a arte nos aponte uma resposta,

mesmo que ela não saiba
e que ninguém a tente complicar,

pois é preciso simplicidade pra fazê-la florescer,
porque metade de mim é platéia e a outra metade é a canção.

E que a minha loucura seja perdoada,
porque metade de mim é amor
e a outra metade também.

(Oswaldo Montenegro)

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