Que a força do medo que tenho,
não me impeça de ver o que anseio.
Que a morte de tudo o que acredito,
não me tape os ouvidos e a boca,
pois metade de mim é o que eu grito,
mas a outra metade é silêncio.
Que a música que ouço ao longe
seja linda ainda que tristeza.
Que a pessoa que eu amo,
seja pra sempre amada, mesmo que distante,
porque metade de mim é partida
e a outra metade é saudade.
Que as palavras que falo
não sejam ouvidas como prece,
nem repetidas com fervor:
apenas respeitadas como a única coisa que resta a mim,
inundada de sentimento,
porque metade de mim é o que ouço,
mas a outra metade é o que calo.
Que essa minha vontade de ir embora
se transforme na calma e na paz que eu mereço.
Que essa tensão, que me corrói por dentro,
seja um dia recompensada,
porque metade de mim é o que penso
e a outra metade um vulcão.
Que o medo da solidão se afaste.
Que o convívio comigo mesmo se torne,
ao menos, suportável.
Que o espelho reflita em meu rosto um doce sorriso,
que me lembro ter dado na infância,
porque metade de mim é a lembrança do que fui
e a outra metade não sei.
Que não seja preciso mais que uma simples alegria,
pra me fazer aquietar o espírito
e que o teu silêncio me fale cada vez mais,
porque metade de mim é abrigo,
mas a outra metade é cansaço.
Que a arte nos aponte uma resposta,
mesmo que ela não saiba
e que ninguém a tente complicar,
pois é preciso simplicidade pra fazê-la florescer,
porque metade de mim é platéia e a outra metade é a canção.
E que a minha loucura seja perdoada,
porque metade de mim é amor
e a outra metade também.
(Oswaldo Montenegro)
domingo, 23 de dezembro de 2007
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