Mas há muito mais por se indignar e se chocar no Brasil. Precisamos abrir nossos olhos, mentes e corações diante de outro tipo de violência, a silenciosa e sinistra que atinge nossas crianças e adolescentes, a violência sexual.
Esta mata em vida, porque mata a inocência e a alma. E não há clamor popular, manchetes em jornais. E nem sabemos o número certo dessa violência que torna crianças e adolescentes tão vítimas como as que morreram.
No nosso trabalho de jornalista, já percebemos a morte silenciosa da infância e já nos unimos neste combate que deve ser de cada um. É uma luta de todos nós, de toda a sociedade. É preciso o esforço coletivo, a atitude firme de cada pessoa, o debate do problema, sob os mais variados ângulos e olhares, além de assinaturas de pactos, de planos, articulações, políticas públicas, orçamentárias e o enfrentamento de novos desafios.
Falta ainda muito por fazer. E a ninguém é dado o direito de se omitir. A ninguém é dado o direito de se tornar espectador, espectadora ou cúmplice indireto desse tipo de crime.
Eu falo a você, ao seu coração e à sua mente aberta. Quero falar com o menino e a menina que, todos nós, um dia já fomos. Neste momento, não me interessa o cargo e a função que você ocupa, nem o que faz para viver. Dirijo-me a você, que abriu este Blog e decidiu ler este texto.
Neste momento, eu gostaria de ter a sua reflexão mais profunda em busca da resposta para o que de fato você deseja na vida. Eu quero saber se você é capaz de ousar, sonhar e encontrar as aspirações reais de seu coração.
Não me interessa a sua idade, eu quero saber se você é capaz de se transformar em um tolo, ou uma tola, para amar, viver os seus sonhos e aventurar-se a estar plenamente vivo ou viva.
Também não me interessa qual planeta está em quadratura com a sua lua. São detalhes.
Eu quero saber se você já tocou o centro de sua tristeza, se você já passou, ou passa, por traições da vida, ou se tem se contorcido, e se fechado ou fechada, com medo da próxima dor ou tristeza.
Eu quero saber se você é capaz de se sentar com a sua dor, a minha dor, com a dor dos excluídos deste país, sem tentar escondê-la ou diminuí-la. Mas, sim, encará-la de frente.
Eu quero saber se você pode rir de alegria, da sua, da minha e do próximo, e senti-la como se fosse a sua alegria.
E se você é capaz de dançar, loucamente, e deixar que o êxtase o envolva, a envolva, até as pontas dos dedos dos pés e das mãos, sem aceitar conselho para ser mais cuidadoso, mais cuidadosa, mais realista, e nem sequer se lembrar de suas limitações humanas.
Também não me interessa, neste momento, se a história que você conta é verdadeira ou falsa.
O que eu quero saber é se você é capaz de desapontar o outro, a outra, para manter a sua verdade.
Se você é capaz de suportar a acusação de traição e não trair. E, ainda, se é capaz de jamais trair a sua própria alma.
Eu quero saber se você tem certeza que pode ser confiável. E só você pode dar esta resposta.
Eu quero saber se você pode ver a beleza, mesmo quando o dia está cinza, brusco e carregado de nuvens. E mesmo assim ligar a sua vida à presença de Deus.
Eu quero saber se você é capaz de viver com os seus fracassos, os meus fracassos, aceitar os erros, reconhecê-los, admiti-los e, mesmo assim, sentar-se às margens de um lago e gritar para os reflexos da lua: “Sim! Eu errei! Eu aceito! E vou tentar fazer melhor!”
Também não me interessa, neste momento, onde você mora e quanto dinheiro tem. Eu quero saber se é capaz de acordar depois de uma noite de luto, de desespero absoluto, de solidão, exaustão e ferido, e ferida, até o mais fundo da alma, levantar e fazer aquilo que precisa ser feito.
Não me interessa, neste momento, quem você é e como chegou até aqui. Mas eu preciso saber se você tem coragem suficiente para se sentar comigo no centro do fogo, não fugir, e arder comigo até o final.
Não me interessa onde, quando e com quem esteve ou está. Eu preciso saber o que sustenta você, interiormente, quando tudo desaba ao seu redor.
Eu preciso saber se você é capaz de ficar só, consigo, e se realmente é boa companhia para si, nos momentos mais vazios, de desespero e de solidão total.
Porque eu conheço centenas e centenas de pessoas assim, como você, que aqui está, generosa e solidariamente, nesta leitura, e a edificar o dia-a-dia deste país e, ainda, aos poucos, ajuda a transformar a nossa cultura, até aqui viciada.
Por isso, acredite, nenhum de nós está aqui por acaso. Estamos aqui para somar inteligência, força, cabeça e corações. Acredite: juntos, somos uma potência!
E que Deus nos ajude a fazer o melhor, individual e coletivamente, neste país. Em especial pelas crianças, adolescentes e excluídos do Brasil.
Feliz 2008!
Vania Mara Welte
* Busquei inspiração também na letra da música “Angel”, enviada para mim, há mais de seis anos, por uma pessoa importante que já se foi...