A vida, nossa casa habitada.
Os gestos são mobiliários,
pequenos objetos que vamos colocando
num cômodo e noutro,
enfeitando a sala,
predispondo em fileiras na cozinha,
guardando no armário do banheiro.
Os ganhos de cada dia são como as flores
que nascem como por encanto,
sem terem sido plantadas,
ervas daninhas, abelhas no pé de limão,
formigas em torrão de açúcar,
distraídas horas do entardecer.
Nossa casa habitada, a vida.
Os tropeços que a gente dá,
rachaduras na parede,
curto-circuito, canos entupidos,
goteiras da torneira.
E tudo se recupera:
janela emperrada,
reboco mal-feito,
portão que não abre,
relógio parado.
Sem querer a gente vai que vai
atulhando de lembranças
os porões nem sempre visitados.
E quando se visita,
ah, meu Deus do céu,
quantas históriasde delicadezas e dores,
páginas que não foram viradas,
tempos que insistem em não morrer…
Ali, em meio à agonia,
os mortos reescrevem arremedos de suas vidas.
E assim a casa vai se atulhando
de cristais e pratarias,
pedaços de tecidos,
horas em fragmentos,
corredores nascidos do peito.
Até que vem o dia:
o soalho encerado,
a mala pronta,
nada fora do lugar.
A Eternidade chega e habita a casa.
Lá fora, a vida continua a enrolar o novelo,
queixando-se do muito que ainda tem por fazer…
(Poema do talentoso e sensível poeta, jornalista e amigo, Zeca Corrêa Leite)
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